Os dilemas de um cientista social recém formado

Não fiz nenhum comentário até agora sobre minha formatura, ocorrida dia 27 de Janeiro. Talvez porque, esse rito de passagem, que rearranja minha situação de liminaridade, tenha um conteúdo muito mais formal do que prático. Não que eu negue sua importância, mas é que compartilho das reflexões de Bourdieu quando este afirma que o diploma, como legitimador da obtenção de determinado capital simbólico, serve apenas para aqueles que não o obtiveram. Essa problemática coloca para mim um dilema ético muito mais abrangente do que a prática profissional, que respaldada em legislação específica, tenho o direito a partir desse momento de exercer.

Ora, o cientista social formado tem uma responsabilidade ímpar e o fato dele produzir discursos criteriosos como tentativa analítica do mundo o coloca diante de um compromisso ético irremediável: como intelectual, exerce um papel considerável nos interstícios do tecido social. Por mais que este papel seja menosprezado no mainstream midiático, é ele que, como cientista, colabora para a construção de um modelo mais intelegível das redes de sociabilidade. Não que o cientista social carregue este fardo sozinho, mas é que por meio de sua característica, de seu olhar particular diante do "fato social" e de sua "imaginação sociológica", é ele que carrega a legitimidade de considerar conjecturas e tendências. Esta característica, porém, não lhe concede o direito de menosprezar outros tipos de discursos que visam construir tentativas de organizar o entendimento do mundo. 

É por esses motivos, entre tantos outros, que assumo este papel, sempre com o cuidado de não submeter a realidade concreta aos designios engessados de qualquer teoria que seja. Alias, sempre achei muito mais fácil fazer ciência social desse modo: submetendo a complexidade e o dinamismo da realidade aos imperativos categóricos das teorias, sejam elas quais forem. O grande desafio de todo cientista social é justamente fazer o inverso: enquanto cientista, é a teoria que é posta a prova diante da concretude e da objetividade do conjunto das relações sociais. 

É por tudo isso que estou feliz, pela etapa concluída e pelo novo que se inicia, mas também preocupado, pela grande responsabilidade que adquiro. Espero que esta nova condição, antes de tudo, me auxilie a ser mais humano e a considerar a humanidade do outro como condição primeira e essencial para a prática científica. E este fardo faço questão de compartilhar...

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